A minha vontade de Buenos Aires sempre foi literária. Como já disse aqui e aqui, a literatura argentina foi a minha favorita durante os anos de faculdade de letras na UFBA e ainda hoje me acompanha, embora com menos frequência. Passar um dia em Palermo é voltar a este passado, o que sempre me traz boas recordações.
Dedicamos este dia de viagem a Palermo Viejo como fizemos em todas as outras três vezes que fomos a Buenos Aires. Do Infinito hotel até o centrinho de Palermo Viejo não levou mais do que 30 minutos de caminhada e, com o clima ameno que fazia em Buenos Aires, foi rapidinho.
É, sem dúvidas, um dos meus bairros favoritos .
Tem o charme antigo e meio decadente de Buenos Aires, mas também tem lojas descoladas, bistrôs, bares, feirinha, arte na rua, enfim… tudo o que eu gosto por demais! E como a cereja do bolo, tem as ruas por onde Borges passou durante a sua infância.
As ruas de Buenos Aires
já são minhas entranhas
Não as ávidas ruas, incômodas de turba e de agitação,
mas as ruas entendiadas do bairro,
quase invisíveis de tão habituais,
enternecidas de penumbra e de ocaso
e aquelas mais longínquas
privadas de árvores piedosas
onde austeras casinhas apenas se aventuram,
abrumadas por imortais distâncias,
a perder-se na profunda visão
de céu e de planura.
Jorge Luis Borges, Fervor de Buenos Aires, 1923.
É uma boa pedida fazer este roteirinho já próximo de meio dia, para que o primeiro ponto seja o restaurante Don Julio, um clássico de Buenos Aires.
Sim, é carne e tem muito monte de brasileiros. Mas um clássico não deve ser ignorado! Para os vegetarianos há uma boa oferta de pratos. Estivemos lá em 2010 e em 2016 pareceu ainda mais requintado.
Se a fome não for de carne, mas de compras, a uma distância que pode ser percorrida à pé está o Distrito Arcos. É um pequeno outlet, com poucas opções internacionais, mas muito agradável de se caminhar.
A caminhada do Dom Julio até o Distrito Arcos pode ser ideal para fazer a digestão e encontrar espaço para a sobremesa ou então para provar um aperitivo na Winery, uma loja de vinhos completíssima no local.
Voltando para o centro de Palermo, vale a pena passar na Calle Serrano 2135, onde viveu Jorge Luis Borges durante sua infância até adolescência.
Me impressiona que não tenha virado uma casa museu ainda. Pode-se retornar para o ponto central de Palermo, a Plazoleta Cortázar, antigamente chamada de Plaza Serrano, pelas calmas ruas adjacentes. Observando a farta exposição de arte de rua.
Durante o outono, as ruas ficam tomadas pelas folhas das árvores, o que torna ainda mais agradável o passeio.
Na área central do bairro de Palermo Viejo estão as lojas de design mais interessantes da cidade. São lojas de decoração, roupas e acessórios, todas com a pegada moderna e cool.
Uma parada obrigatória para mim é a Saboneteria Sabater Hnos, Calle Gurruchaga 1821, onde também existem mais lojas de outlet, entre outras lojas tão interessantes quanto esta. São sabonetes de todas as cores, formatos e cheiros, que inebriam o ambiente. Desde os tradicionais morango e limão a outros mais inusitados como manga e chocolate.
Alguns sabonetes têm frases provocantes como “quieres banharte conmigo?” Ótimos para se presentear em um souvenir exclusivo e diferente. Após as compras, que tal tomar um café ou uma Quilmes na Plaza Serrano, observando o movimento que começa a crescer a partir das 17h?
Esta praça é considerada o coração de Palermo e foi homenageada com o nome do escritor Cortázar em 1994, quando do aniversário de 10 anos de sua morte.
Para finalizar a noite um programa que parece sob medida para o turista brasileiro e que eu adorei é o The Argentine Experience. É possível ir à pé da Plaza Cortázar, mas aconselho que o faça com fome e sem ter bebido muito, pois no The Argentine Experience tudo é superlativo.
Considerado o segundo melhor restaurante da cidade pelo Tripadvisor, não é necessariamente um restaurante, mas um lugar que aproxima pessoas entre si e da cultura portenha. São duas mesas enormes, nas quais ouvimos, pontualmente a partir das 20h, causos e piadas muito sagazes sobre os costumes argentinos e, especialmente, dos moradores de Buenos Aires.
Ao chegar, recebemos este avental e um chapéu para todos ficarmos iguais. O clima foi ficando cada vez mais descontraído, com todos conversando e interagindo. Talvez tenha sido o efeito do vinho, talvez a qualidade da conversa, mas os sorrisos indicam como foi legal a experiência.
Fizemos nossas próprias empanadas, a minha de queijo, mas também havia recheio de carne. E elas foram assadas e depois nos servidas quentinhas.
Estava um pouco apreensiva com o meu prato. O The Argentine Experience é famoso por ser umas das melhores carnes de Buenos Aires, mas como se sairia com um prato vegetariano?
Bastou chegar meu prato para comprovar: Maravilhoso como tudo até então! Na verdade, percebi de todos na mesa uma pontinha de inveja do meu prato, estava lindo! 🙂
Terminamos a noite, com um misto de satisfação, um pouco inebriados pelo vinho e muito contentes pelo dia especial que Buenos Aires nos proporcionou.
¿Quién los ve andar por la ciudad si todos están ciegos?
Ellos se toman de la mano: algo habla
entre sus dedos, lenguas dulces
lamen la húmeda palma, corren por las falanges,
y arriba está la noche llena de ojos.
Julio Cortázar, Los Amantes, Algunos pameos e otros prosemas.
Comprei o ingresso em uma promoção do Blog Aires Buenos.
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