Combinei a viagem da Áustria com República Checa. Então não consegui ler a média que tenho mantido de 5 a 10 livros por país, já que combinei as leituras de viagem para Áustria com a Chéquia.
Duas autoras, dois livros completamente diferentes.
Leituras de viagem para Áustria
Elfried Jelinek
A pianista
Elfried Jelinek é uma escritora austríaca, particularmente conhecida no país por suas obras em dramaturgia e por ser Nobel de Literatura de 2004.
Muitos conhecem a obra pelo filme que foi indicado a diversos prêmios como o Bafta e que possibilitou o César para a excelente atriz Izabelle Rupert, que interpreta o papel principal. O filme chamado “A professora de piano” fez algum burburinho no Brasil.
Alguma coisa de cor e forma indefinidas começa a oscilar, escorrega, alguma outra grita como se tivesse sido espetada. Uma névoa espessa de veneno vienense paira sobre esse prado popular.
O livro é mais sutil, são mais camadas para a personagem e a atmosfera de sufocamento é mais intensa, especialmente pelo controle da sua mãe. A mãe é outra personagem forte do livro.
Por vezes trata Érika como uma criança pequena, quando quer a exclusividade do amor, ou como uma aluna desleixada, quando quer aplicar o rigor à artista e arrimo de família.
Não conseguimos ver muito Viena no livro, pois ela está mais no psicológico dos personagens, mas podemos notar o modo de viver dos que estão ligados à música clássica. Ou será o modo de viver de todos nós, envoltos nas obrigações e desejos diversos: de sermos reconhecidos, estarmos na moda, sermos invejados e disputados por amantes jovens e sexualmente atrativos?
A caminho da escola, ela se sente quase forçada a ver em toda parte a morte de pessoas e de alimentos, e só raramente vê algo crescendo e prosperando. No melhor dos casos, no Rathauspark ou no Volksgarten, onde as rosas e as tulipas brotam, carnudas. Mas até mesmo essas flores estão se alegrando cedo demais, porque em seu interior já está o tempo de murchar. É nisso que Erika pensa. E tudo se comprova nesses pensamentos. Em sua opinião, só a arte tem uma duração mais longa
As demandas que uma dedicação traz, o ambiente competitivo, as frustrações e pequenas vitórias da pianista.
Tudo isso e muito mais está em A Pianista. Também está uma Viena repleta de flores, sinfonias e intelectualidade. Está uma Viena em que o mais luxuriante ato ocorre em seus parques densos e fechados, uma Viena escondida e perversa, bonita, mas com uma história marcada por pecados inconfessáveis.
Ines Rieder e Diana Voigt
Desejos Secretos- A história de Sidonie C. A paciente homossexual de Freud
A biografia de Sidonie C., a primeira paciente homossexual de Freud. O título apelativo não faz jus a uma das melhores biografias que já li. Confesso que biografia não é o meu gênero favorito, então também não tenho uma quantidade enorme de biografias no currículo.
Talvez tenha gostado por ser uma biografia romanceada, com elementos próprios da ficção, como o ir e retornar do tempo e a contextualização histórica tratada com o mesmo fluir dos fatos mais banais da vida da personagem.
Sidonie C. foi uma mulher comum. Não era à frente do seu tempo enquanto pensamento. Não tinha grandes aspirações ou talentos e, ainda assim, viveu uma vida extraordinária. Uma vida que poucos nós podemos nos gabar.
Viveu o esplendor de Viena antes das duas grandes Guerras, ao fazer parte de uma das famílias ricas e comercialmente influentes da cidade. Quase não percebeu a primeira guerra mundial, envolta em um romance tórrido com uma baronesa.
E é exatamente essa paixão e o final da primeira guerra que aproximam as vidas de Sidonie e Freud. Seus pais, preocupados com a fama e imagem social da filha, a levam ao já famoso Dr. Freud.
Hoje é particularmente um dia desagradável, pois um rol radiante brilha no céu sem nuvens e um tempo desses seria muito mais bem aproveitado num belo passeio a pé. Durante o trajeto do bonde, Sidonie não foi para o interior do vagão, mas ficou de pé na plataforma aberta e deixou que o vento cálido da primavera soprasse em seus ouvidos. Quando o tempo é bonito assim, ela gosta de Viena. Os dois grandes Museus, com a robusta Maria Theresa entre eles, sobre seu pedestal na praça, lhe parecem os mais imponentes do mundo. E a Palas Atena, em frente ao parlamento, a consola em sua beleza majestática, superior e imperturbável, não obstante o flamular da bandeira da jovem república, logo atrás.
A Segunda Guerra Mundial atropela uma Sidonie que, atordoada, não entendia o que significava ser judia com uma Áustria aliada ao nazismo alemão. Ainda que tivesse sido batizada como católica ainda bebê, isso em nada valia para as novas leis de segregação.
Nesse momento, o livro deixa um pouco os aspectos sociais, pessoais e amorosos de Sidonie e a verdadeira aventura se inicia. Talvez esse seja um marco comum na literatura e na vida: quando saímos da proteção de nossa família, de nossa casa e te tudo que conhecemos, é que as coisas começam a acontecer.
Sidonie embarca, no auge da 2ª Guerra para Berlim e se despede do seu grande amor, a Baronesa Leoni Von Puttkamer. Segue até a Rússia, rumo ao oriente, para onde pretende pegar um navio até Cuba e ficar a salvo da perseguição nazista aos judeus e homossexuais na Europa.
Chega ao Japão, onde mora por um mês, até embarcar em um navio até São Francisco, nos Estados Unidos. Em 1940 chega a Havana, onde passará 8 anos, depois Nova York, Paris, Tailândia, interior da Espanha, novamente EUA, retorno para Espanha, Viena e (pasmem) Rio de Janeiro.
Sidonie morou no Brasil de 1971 a 1973, onde trabalhou como governanta de um casal de diplomatas. Aos 98 anos decide fazer uma última viagem para encontrar Carlos, uma paixão não concretizada no navio que partiu do Japão ao Eua.
Com uma vida tão fantástica, ser a paciente homossexual de Freud é uma fichinha, não?
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