Contamos nossa experiência a bordo do único cruzeiro cinco estrelas da Amazônia, o Iberoestar Grand Amazon
A Amazônia é um grande mistério, mesmo para boa parte de nós brasileiros. Os seus clichês reforçam essa sensação: o pulmão do mundo, as árvores imensas, os perigos escondidos na mata, os enormes insetos, cobras, jacarés…
Sim, dá medo pensar em se aventurar por ali. Mesmo os luxuosos hotéis de selva nos remetem a algo intocável, longínquos indícios de vida flutuando nas copas das árvores ou nadando no fundo dos rios.
Ao mesmo tempo que é vida pulsante, a Amazônia também é perigo e morte. Implacável, a natureza e seus ciclos.
Há anos sonhava em conhecer a floresta Amazônica e os dois principais rios Negro e Solimões, mas sempre pensava: será que tenho coragem? Será que vou gostar da aventura?
Quem lê este humilde bloguinho, sabe que já nos aventuramos em lugares bem difíceis, como os desertos (de sal e de areia) da Bolívia, a altitude do Peru, o deserto do Saara no Marrocos e até viajamos em um monomotor (com janelas abertas! 😱) para chegar em Culebra, Porto Rico.
Ainda assim todas essas viagens foram programas com bastante antecedência e buscando o máximo de conforto e segurança possível! Como ter o mesmo com apenas 30 dias de antecedência? Como programar uma viagem assim em tão pouco tempo?
A resposta veio da memória. Li um artigo sobre o navio Iberoestar Grand Amazon em uma revista de muitos anos atrás. Falava da comodidade de uma estrutura 05 estrelas nos rios mais importantes da floresta. Era isso que precisávamos! E assim fomos comemorar nosso aniversário de 15 anos juntos, com muito romance e um pouco de aventura! 😁
Na saída já percebemos que seria um passeio incrível, seja pela vista do Rio Negro e da Ponte Estaiada, dos inúmeros e simplórios barcos de passageiros singrando o rio ou, talvez, pela música ambiente inundando o espaço. Climão só quebrado pelo susto do sonoro aviso de partida…
O NAVIO
O Iberoestar é o maior navio de passageiros que circula nos rios negro e solimões. São 73 cabines, todas com varanda e o mesmo conforto de um quarto de hotel. Ar condicionado, cama grande e confortável, frigobar, televisão com canais a cabo, café nespresso no quarto, amenities… só lembrávamos da floresta ao olhar pelo vidro da varanda. No quesito estabilidade também nada sentimos, nem o mais leve balançar, todos os remédios para enjoo ficaram intactos.
São oferecidos dois passeios: de 05 dias pelo Rio Negro e de 03 dias pelo Solimões. Nós fizemos o segundo. Encontramos casais que fizeram os dois e recomendavam, embora possa parecer um pouco calmo demais para quem é muito agitado. Ele parte às sextas para o roteiro dos Solimões e segunda para o maior, do Rio Negro. Alguns passageiros me contaram que o Rio Negro é mais desabitado e selvagem, pois suas águas negras e muito ácidas não são boas para o cultivo ou pesca.
Já o Solimões, embora não tenha águas com tonalidade “bonita”, é pura fertilidade.
Eu ficaria mais tempo no navio… achei sensacional!
O entretenimento é um pouco escasso, a maior parte da atividade acontece fora, dentro das seis lanchas que sobem e descem com os passageiros pelos rios e igarapés. Ainda assim tivemos um show com a banda de samba formada pelos guias (bem amadora e divertida) e bingo. Mas a sensação era ficar no deck apreciando a vista das populações ribeirinhas, a mudança da paisagem ao se adentrar no Solimões e alguns botos que nos acompanharam nadando ao lado do navio.
Além do marido, tive a companhia do livro “Dois Irmãos” do escritor amazonense Milton Hautom, uma ficção que retrata a Manaus dos anos 50, uma escrita muito elegante em uma rede de eventos trágicos que formam a vida de dois irmãos gêmeos. Para quem esqueceu de levar um livro, a biblioteca do navio tem alguns exemplares em várias línguas, não se trata de uma biblioteca propriamente dita, mas uma estante, e pelo que vi tem para todos os gostos. Basta pedir na recepção.
Para quem prefere exercitar o corpo, existe uma academia, com uma esteira e um elíptico, além de um janelão para o lado esquerdo do navio. Embora pequena, supriu nossa necessidade de uma atividade mais enérgica, além de ser climatizada, portanto, muito confortável.
O navio possui ainda uma lojinha de artesanato, com vários itens que vimos também em Manaus e pouca diferença de preço. Nesta lojinha também há capa de chuva, a salvação para os turistas desavisados.
São duas piscinas e uma jacuzzi, meu lugar favorito no deck. Nenhuma é climatizada, mas não fez falta, pois o calor era permanente, inclusive com chuva!
Lugar ideal para aquele ditado metido: “se um dia fui pobre, não me lembro” :).
COMIDA E BEBIDA
Meu maior receio (motivo de nunca ter feito cruzeiro até então) era do esquema bandejão: filas enormes para comida ruim. Nossa estréia surpreendeu! Nem filas nem comida ruim! O sistema all inclusive funciona muito bem e os dois jantares principais de comida amazônica e do capitão (sábado e domingo) superaram as expectativas. As bebidas também foram um capítulo à parte. Drinques à vontade preparados com bebidas de qualidade: vodca Absolut, tequila José Cuervo, Rum Bacardi e espumante Terranova.
Só o vinho Aurora tinto e branco deixa a desejar para os apreciadores de vinho. Esse “deslize” é solucionado com a possibilidade de se comprar vinhos de alta qualidade. Compramos um Carmen, mas os preços eram um pouco acima do mercado. Alguns amigos que já fizeram cruzeiro disseram que, na maioria dos cruzeiros, há a possibilidade de comprar um clube de vinhos e obter descontos, mas não nos foi oferecida essa opção no Grand Amazon.
O melhor jantar é o do capitão, como era de se esperar, mas o jantar amazônico também foi de lamber os dedos. Para quem é vegetariano não há uma alimentação específica, mas sempre uma variedade de legumes e a chapa que salva o dia, tanto no deck como no restaurante.
Os lanchinhos no deck do navio também eram ótimos e estavam disponíveis em boa parte da manhã e tarde, pizza, hotdog, sanduíches naturais e uma grelha com verduras e carne. Também há a possibilidade de pedir serviço de quarto e tudo está incluído na diária. Os docinhos matam qualquer pensamento em dieta, principalmente os feitos com ingredientes da região, como geleia de cupuaçu e outras frutas.
OS PASSEIOS
O Grand Amazon oferece de 2 a 3 passeios por dia na programação. Não fizemos todos, porque queríamos descansar e porque passamos do horário no bar da boite na noite anterior 🙂 Os guias pedem que se escolha os passeios e os horários com antecedência para melhor organização. Na primeira noite, apenas uma palestra de segurança, apresentação do staff, brinde de boas vindas com espumante e o jantar.
No dia seguinte, às 8:30 já estávamos no barco para conhecer a casa do cabloco. Chovia, que é o clima preferido da Amazônia: chuva e calor! E em outubro parece que ele vem inteiro
“Fazia um calorão danado, o sol de outubro nos entorpece, uma sonolência mórbida nos imobiliza como uma anestesia poderosa.” Milton Hatoum, Dois irmãos.
A “casa do cabloco” não trouxe novidades, principalmente para quem nasceu no interior da Bahia e sabe como é a vida da agricultura de subsistência.
O mais interessante é a chegada até lá! Vimos diversos pássaros e jacarés, sim, muiiiiiitos jacarés, de dois tipos diferentes o tinga e o açú. A população que mora e comercializa em barcos, mesmo proibidos pela falta de saneamento, também é muito interessante.
Passamos a manhã inteira percorrendo um afluente do solimões e ao retornar ainda vimos o primeiro boto nadando perto da lancha!
O segundo passeio foi a pesca de piranha. As lanchas saem em dois horários 14:30 e 16:30, nos informaram que não era possível fazer duas vezes, mas quem marcou 14:30 conseguiu uma vaga no de 16:30. Questão de sorte! Então, se gostou da pesca, fique atento, vá no primeiro horário e torça para um espaço no segundo.
EM outro braço do solimões e em locais já conhecidos, todos sacam varas de bambu com iscas de carne para pescar piranha. Fiquei entendiada nos primeiros minutos, confesso também que estava com pena das piranhas :(, mas o marido se amarrou e poderia ficar horas pescando. O passeio alternativo é visitar a cabine do comandante, que tem vários horários disponíveis.
O terceiro passeio de barco acontece à noite e é o mais emocionante. Alguns minutos na escuridão do rio, iluminados apenas pelo pequeno foco da lanterna, procurando por jacarés. “Quem em sã consciência faria algo assim?”, me perguntei, mas nosso já familiar barco estava surpreendentemente cheio.
Eis que, o navegador vê um balanço suspeito, encosta o barco na margem e o guia, praticamente dobra o corpo sobre o rio e de lá sobe com um jacaré. A espécie mais comum no solimões, sem uma perna e parte do rabo, provavelmente comido por piranhas. Todos ficam estáticos, depois eufóricos, alguns com medo, outros contando piadas.
Algumas explicações biológicas e a devolução do pequeno e agressivo jacaré à margem. Mais procura, outros jacarés… alguns escapam, outro volta para o barco. No fim do passeio, o mais profundo silêncio e uma brisa fresca, inédita até agora, pairando no ambiente.
“A floresta: é sobrevoar, admirar, assombrar-se e desistir” Milton Hatoum, Dois irmãos.
No dia seguinte fomos em uma curta caminhada na região do Lago Janauarí. Realmente interessante o passeio, caminhando um pouco da margem do rio, já se sente na selva densa e úmida, o imaginário da maioria quando se fala em Amazônia. Exemplares de aves, plantas e, principalmente, árvores maravilhosas!
A região do Lago Janauarí é composta de muitos igarapés, nome em tupi que significa “caminho de canoa”. Nos momentos de cheia dos rios, as passagens se tornam navegáveis, permitindo outro tipo de passeio. Para conhecer a floresta parcialmente submersa, deve-se ir nos meses de maio a julho. No início do passeio há uma feirinha de artesanato em uma casa flutuante e um restaurante. Essa casa flutuante funciona há mais de 60 anos e vende artesanato das comunidades indígenas à beira do Solimões.
Os guias vão à frente ajudando a caminhar na lama que se forma de folhas em decomposição e da chuva intercorrente. De repente um lago com vitórias régias nos espera à frente. Estavam sem flores, mas ainda assim são interessantíssimas de se ver. Quando desabrocha sua flor vive por três dias e em três cores: branca, rosa e lilás.
A última noite é de festa! Jantar do capitão com pratos à la carte, opções refinadas e muito espumante. Um show folclórico bem animado segue o jantar, no local que é uma mistura de boite com centro de convenções do navio. Divertido e despretensioso.
Ao final do cruzeiro, na segunda bem cedo – o comandante indica que todos estejam prontos às 7h /7h30min para o check-out – o momento mais esperado: Encontro do Rio Negro com o Solimões, que pela diferença de ph e temperatura das águas, percorrem juntos por mais de 10km, formando o Rio Amazonas.
O Rio Negro possui um ph que chega a quase 5, velocidade de 2km e temperatura 25º, enquanto o Solimões tem ph superior a 7, temperatura de 28ºC e velocidade de 4 a 6 km.
Essas diferenças fazem com que caminhem lado a lado, como um casal.
DICAS PARA UM PASSEIO PERFEITO
Lemos alguns blogs que indicavam levar acessórios. Alguns, como repelente, tive cuidado de comprar, mas outros como capa de chuva, não levei e me arrependi. Para que o passeio seja perfeito e sem preocupações, recomendo que leve de casa: capa de chuva,binóculo, repelente, capa para câmera, sapatos e roupas de secagem rápida.
Isto porque, ainda que não chova, o que é difícil na Amazônia, de índice pluviométrico elevado, a maioria dos passeios é feito de barco, o que pode levar a molhar a roupa e a mochila. Por isso, a capa de chuva para o corpo e para a máquina de fotografar é tão importante.
Em relação ao repelente, o recomendado pela Fiocruz é levar um a base de DEET em 30% ou Icaridina em 25%, os únicos comprovadamente eficientes contra a malária. Compramos o Exposis Extreme, pois foi difícil encontrar um com DEET neste percentual. Aplicamos apenas duas vezes ao dia e não levamos nenhuma picada. Dizem que o Solimões tem muitos mosquitos, mas não sentimos isso, embora as pernas de alguns estrangeiros denunciassem o contrário.
Foram três dias incríveis e uma ótima estreia ao mundo dos cruzeiros. Embora saiba que é difícil encontrar cruzeiros em barcos tão pequenos e intimistas, onde as relações podem se estreitar ou ter a surpresa de nos vermos sozinhos apreciando os Rios Negro e Solimões, descobrindo um novo mundo, tão perto de casa.
“Caminhamos até o porto da Catraia e embarcamos em um motor que ia levar uns músicos para uma festa de casamento à margem do Acajatuba, afluente do Negro. Durante a viagem, Domingas se alegrou, quase infantil, dona de sua voz e do seu corpo. Sentada na proa, o rosto ao sol, parecia livre e dizia para mim: “Olha as batuíras e as jaçanãs”, apontando esses pássaros que triscavam a água escura ou chapinhavam sobre as folhas de matupá; apontava as ciganas aninhadas nos galhos tortuosos dos aturiás e os jacamins, com uma gritaria estranha, cortando em bando o céu grandioso, pesado de nuvens.”
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5 Comentários
Tassia
2 de maio de 2018 em 12:16Muito legal o seu relato! Estamos indo para Manaus na semana que vem! 😉
viagensinvisiveis
3 de maio de 2018 em 21:57Que legal! Boa viagem!
Vanessa alves
1 de outubro de 2018 em 20:58Oi Nivea,
Um prazer ler sobre suas viagens, vcs teriam dicas de passeios em Havana? Um grande bj
Vanessa alves ( sua colega da sacramentinas). Amazônia já na minha lista
viagensinvisiveis
2 de outubro de 2018 em 20:13Oi Vanessa, que maravilha te ver aqui! Olha vou dar prioridade a eles, em breve estão no ar! bjs
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