Passamos três dias inteiros no Altiplano Boliviano e vou logo dizendo: é pouco. Ver muita beleza natural intocada chega a cegar. Senti que poderia passar horas somente olhando algumas das lagunas que cruzamos. Mas quem tem a vida inteira para apreciar as lagunas bolivianas? =)
Chegamos no horário estimado pela Amaszonas Aviacción, às 07:15 em Uyuni. O motorista estava nos esperando no aeroporto e nos levou direto para o Cemitério dos Trens. Uma antiga estação ferroviária com trens enferrujados. É ótimo lugar para tirar fotos, embora eu não tenha tirado nenhuma que valha a pena.
Esta foi a melhorzinha.
É que estava tão ansiosa para ver as lagunas, os flamingos, que nem demos atenção ao local. Depois vi fotos lindas e fiquei pensando que talvez valesse a pena ficar mais, mas o primeiro dia tinha uma programação muito puxada.
A segunda tração era o Valle de las Rocas, um conjunto de rochas enormes, que parecem estar totalmente fora de lugar,. Em meio a um planalto, são os frutos de erupções vulcânicas milenares.
A questão é que não vimos vulcões lá perto, mas certamente estiveram. É um ponto de escalada muito conhecido para iniciantes, principalmente os que desejam testar seus pulmões a 3.800 metros de altitude. Passamos por povoados, como o Villa mar e vimos pessoas cuidando de suas plantações à beira de um córrego ou pastoreando suas llamas.
A primeira grande estrela a ser vista era a Laguna Colorada.
A primeira grande estrela a ser vista era a Laguna Colorada.
E ela é de uma beleza tão difícil, que ficamos em dúvida se a falta de folego vinha dos flamingos ou dos 4 mil metros de altitude. Toda a paleta de cores, do azul da laguna, sua cobertura de algas vermelhas misturada ao rosa dos bichos que dela se alimentam, o ocre das montanhas, tudo continuará no mesmo lugar, quando o olho não mais pousar sobre ela. Nos sentimos insignificantes e abençoados.
Enquanto eu montava o tripé para tirar esta foto acima, vi tudo branco e quase desmaiei. Era a altitude mostrando a sua força. Mesmo tendo me preparado com aclimatação em La Paz, tomado oxigênio no hotel em La paz e sorochi pills logo antes do tour, o corpo mostrava que poderia sucumbir aos mínimos esforços. Providencial então a parada para o almoço e descanso.
Almoçamos em um restaurante caseio, mas com a comida que o guia trouxe, esta aqui. Foi então que senti um sentimento de profunda empatia com a família que nos recebeu. Moram em um lugar ermo, isolado, sem energia, saneamento ou água corrente, banheiro sem privada e sem o mínimo que julgaríamos imprescindível. Até para quem nasceu no sertão, no árido baiano, foi tocante.
Tudo bem que eles tem esta vista diária, então estão em posição de superioridade em relação a muitos de nós, não? =)
Ao sair pela Laguna Colorada, vimos o primeiro dos dois postos de controle da Reserva Natural Eduardo Amaroa. O nosso motorista entregou os tíquetes que pagamos junto com o tour e seguimos para os gêiseres.
Para quem não sabe, gêiseres são jatos de água ou vapor que, não aguentando a pressão no interior da terra, sobem para a superfície, normalmente de origem vulcânica. O gêiser de Sol da Mañana tem um cheiro forte de enxofre e é realmente muito quente. Colocar a mão ou se aproximar demais pode causar queimaduras sérias. Fiz um vídeo, mas ficou bem tremido porque havia muito vento no local.
Depois de percorrer um longo caminho e passar pela devastadora altitude de 5000m, pudemos perceber que ela não deixa nada prosperar, só um imenso deserto árido, com poucas plantas rasteiras que, aqui e ali, conseguem sobreviver. É fácil sentir uma leve dor de cabeça, mesmo estando apenas passando pelo local. Qualquer desconforto acabou ao nos depararmos com a Laguna Verde.
Esta laguna de cor verde intenso é formada por sedimentos de cobre e outros metais. Pela combinação destes elementos, nada sobrevive ali, foi a única laguna em que não vimos nenhum pássaro, flamingo, planta ou animal. Em compensação a visão da cor, da sua enormidade com as ondas formadas pelo vento, nos deu a impressão de estar em uma praia.
Para arrematar está o Vulcão Lincancabur, 4.300 metros acima do mar.
No retorno, passamos pela águas termais de Polques, uma pequena piscina de água quente em uma visão estonteante.
A água está a constantes 37º, oriunda das mesmas fonte dos gêiseses que vimos antes.
Muitos tomam banho e o local tem um restaurante familiar com banheiro, porém estava fechado. Uma menininha me deixou entrar e ficou guardando a porta, mas não tive coragem de tomar banho pois lá fora estava bem frio e não havia como trocar de roupa depois. Além disso, acho que a visão exterior ainda estava mais atrativa.
Para arrematar a visita, quase tomamos uma carrera (se fala assim aqui na Bahia) de uma mamãe-llama. Não percebemos que havia um filhote perto e nos aproximamos demais. Resultado: ela ameaçou correr atrás de nós e saímos bem rapidinho dali. Não tão rápido a ponto de esquecer da foto da lindeza.
No final da tarde, paisagens de cair o queixo.
De repente, tudo muda. O que eram lagunas, gêigeres e águas termais, vira um deserto de um laranja intenso.
Era o deserto de Sioli, uma natureza em estado bruto. O Altiplano Bolviano é inóspito, tudo é difícil, os anos de tecnologia humana estão alheios ao Sioli, por isso penso em natureza em estado bruto.
Tivemos a impressão de que ninguém nunca colocou os pés naquelas areias, talvez, remotamente, um inca assustado fugindo de Aymaras.
Árbol de Piedra
A grande atração do Deserto de Sioli é a Árvore de Pedra, uma interessante rocha em formato de árvore, lapidada pelo vento. Alguns quilômetros mais e chegamos no Hotel do Deserto em Ojo de Perdiz.
Aquele pontinho branco foi onde passamos a noite, no meio do deserto de Sioli.
Paul Auster falava do deserto que nos é inescapável, já que dentro de nós. O altiplano boliviano nos convida a espiar este deserto, a matéria áspera de que somos feitos. Ao mesmo tempo nossa capacidade de transformação.
Saio daqui pensando em como tomar minha vida com as próprias mãos. Ser forte, resistente e simpática como os vários bolivianos que encontramos pela viagem. Se isso não é suficiente para nos fazer melhor, se isso não for o que de melhor uma viagem pode nos fazer, não sei de mais nada, o que também pode ser verdade.
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Um dia no deserto, Salar de Uyuni - Viagens Invisíveis
22 de setembro de 2015 em 02:02[…] respirar tranquilamente em casa. Quer saber mais sobre nossa viagem à Bolívia,clique aqui, veja aqui e confira aqui , ah, tem mais aqui também […]